Segunda Fineza de Jesus Sacramentado para com os homens.
Jesus Se deixou Sacramentado quando quis ausentar-Se dos homens.
Admirável e engenhoso descubro nesta Fineza o ardentíssimo amor de Jesus. Sabia Sua Majestade serem já breves os últimos períodos de Sua vida entre os homens, pois era necessário subir ao trono de Seu Eterno Pai, para desarmar a Divina Justiça quando ela empunhasse a espada contra os pecadores. Porém, Seu amor fazendo ao Seu coração uma violência, ao apartar-Se de Suas criaturas, encontrou um modo maravilhoso de partir sem Se ausentar. Instituiu este inefável Sacramento, no Qual, convertendo a substância do pão na de seu próprio Corpo vivo e animado, deixou realmente no mundo, debaixo de uns poucos acidentes, o mesmo que em uma nuvem voou ao Empíreo*.
Antes quis mostrar-nos serem tão grandes Suas delícias em viver entre nós, que por uma só ausência que fez ao céu, fez-Se presente milhões de vezes aqui na terra. É verdade que uma nuvem O escondeu de nossos olhos no Monte Oliveiras, mas Seu amor designou que Se deixaria exposto nos Altares à nossa vista. Partiu-Se o Divino amante, sem Se ausentar, e, para assegurar-nos de Sua companhia, deu-nos o precioso dom de Si mesmo, deixando-nos empenhado Seu Corpo e Sangue.
Não obstante quisera eu me dissessem que coisa fez no mundo que assim enlaçou e uniu às criaturas o Coração de Jesus! Porque eu não sei mais que o que me diz o Evangelista: que o mundo não O conheceu, e que os Seus não O receberam. Não achou Ele na terra, da qual não soube ausentar-Se, mais que injúrias atrocíssimas e horríveis ingratidões, ferido com açoites, desprezado com opróbrios, um estábulo para nascer, e para morrer uma Cruz. Apenas encontrou um Pedro, que, tendo-O negado três vezes, só uma O confessou. Teve apenas uma Madalena, que, tendo-O ofendido muito, O soube amar.
Porém isso mesmo é o que rendeu o Coração de Jesus, para não poder apartar-Se do coração dos homens. Depois que Sansão deu a entender seu mais fino amor a Dalila, revelando-lhe o maior segredo em que constituía sua vida, diz o Sagrado Texto que ela logo fazia esforço para apartá-lo de si com aversão, porque era tanto o amor em que se abrasava Sansão para com Dalila, que nada o podia separar. Assim fez o mundo com Jesus. Ele o prende com fortes laços de amor, e o mundo o arroja de si com desumanos tratamentos. Mas então se abrasa mais estreitamente com ele o Divino Sansão, e, forjando daqueles acidentes uma cadeia, seu amor quedou-Se para sempre inseparável dos homens no Sacramento.
Aquele Anjo, que, só pelo espaço de uma noite, se estreitou em abraços com Jacó, procurava logo apartar-se dele. "Deixa-me ir-me embora, Jacó", lhe dizia, porque já nasce a aurora, e não convém a um Anjo deter-se mais de uma noite entre os braços de um homem. Mas, ó prodígio do amor divino! O que não é conveniente a um Anjo será conveniente a um Deus? Tanto há podido o amor de Jesus. Poucos instantes pareceram ao Rei dos Anjos os tantos anos que Ele vivera entre os braços e companhia dos homens; e se esses O arrojam de si e O despedem, se nem O conhecem nem O recebem, Ele, para não os deixar, sujeita-se a encerrar-se dentro de um Sacrário, em um rincão de uma Igreja. Mais ainda, como em prisão, sob uma chave.
Ah! Mortais! Se isso não vos faz abrasar em amor para com vosso Deus Sacramentado, asseguro-vos de que tendes entranhas de pederneira e corações de bronze. O Deus de Majestade é vosso prisioneiro, uma chave O guarda no Sacrário. Que maravilhas tão novas são estas que veem nossos olhos? No presépio o amor se faz homem, sendo Deus. No Altar O aprisiona, sendo Monarca. Ó, amor tirano, amor cruel! Exclama aqui Santo Agostinho, por que abates a Majestade? Por que condenas a Inocência?
Assim é, Almas Católicas, o amor condenou Jesus Sacramentado à prisão perpétua. Vede-O aí como preso debaixo dos acidentes de um pouco de pão, dentro de um pobre Sacrário, e entregue a uma vil criatura que, a seu arbítrio e vontade, já o abre, já o cerra. Aqui seguro O mantemos, e dentro daquela custódia nos está sempre dizendo aquelas doces palavras: Ecce vobiscum sum usque ad consummationem sæculi. “Aqui estou convosco até o fim do mundo”. É verdade que vivo e reino no céu, onde tenho Meu trono sobre as asas dos mais altos Serafins. Mas Eu sou realmente o mesmo Que aqui tendes na terra, porque embora deveras tenha-Me ausentado, nunca pude separar-Me de vós, e me entreguei em vossas mãos, oculto neste Sacramento. Já não ouvirão aqui as Almas que Me buscarem o que disseram os Anjos àquela amante, quando ansiosa me buscava no Sepulcro: Non est hic. Já Se foi teu Amado, porque os que guardavam Seu Corpo não souberam velar. Mas como nestes altares está sempre de sentinela Meu amor, não posso nem quero, não tenho coração para ausentar-Me.
Essa é, sem dúvida, a causa por que a Seráfica Virgem, Santa Teresa, se maravilhava quando ouvia dizer: Ó ditoso de mim se me achasse naqueles tempos em que Jesus conversava e vivia no mundo! Essa é uma necedade, dizia minha grande Madre, pois neste Sacramento, cifra do Divino amor, temos o mesmo Jesus, Que como Criança derramava tenras lágrimas num presépio; o mesmo Que quando homem suava, e pregava pelas praças, e caminhava a pé enxuto pelos mares; o mesmo Que, derramando sangue, pendia duma Cruz no Calvário; e, finalmente, o mesmo Que ressuscitou glorioso de um Sepulcro. Para que, pois, suspirar ou desejar outros tempos para ver e gozar da presença de Jesus?
Antes são agora mais felizes nossos tempos, porque então bem podíamos ver e ouvir em carne mortal o Redentor, mas não metê-l'O em nossos corações e em nossas entranhas. Então a uma só Madalena, que ardia em amor por Ele, consentiu que Lhe lavasse os pés com suas lágrimas, beijasse-os e enxugasse com seus cabelos, e dali a pouco tempo lhe ordenou não O tocasse. Então a um só Discípulo, e esse o mais valido, permitiu reclinar-se sobre Seu peito. Mas, neste amoroso Sacramento, não só consente que Lhe beijemos os pés, mas também a boca. Não só permite que folguemos sobre Seu peito, mas oferece a todos que descansemos dentro do mesmo peito, ou que Ele descanse dentro do peito de todos; porque como diz discretamente São Jerônimo, neste dulcíssimo Sacramento, nós comemos a Jesus, e Jesus nos come a nós: Jesus entra em nossos corações, e nós entramos no coração de Jesus.
Vede, pois, se tendes alguma razão de desejar aqueles tempos em que Este Verbo humanado vivia e conversava no mundo. Não me digais que sobre aqueles Altares não vedes outra coisa que uns poucos acidentes de pão, e que se esconde à vossa vista a formosura de Jesus. Porque eu vos peço e suplico que aviveis aquela Fé que recebestes nos peitos da Igreja Católica vossa Madre, que com o primeiro leite de seus infalíveis documentos vos instilou, que neste admirável Sacramento está o Corpo e Alma de Jesus com todas Suas perfeições e excelências.
Levantai, pois, com a consideração o sutilíssimo véu daqueles acidentes que cobrem o Corpo de Jesus, e vereis aquele mesmo rosto que na Glória desejam ver os Serafins. Vereis aqueles mesmos olhos, dos quais uma só vista bastava para serenar os mais afligidos corações. Vereis aquela mesma boca, que tem palavras de vida eterna e é a Fonte de todas as delícias do Paraíso. Ali estão aquelas mesmas mãos, artífices de tantas maravilhas, e aqueles mesmos pés, que na terra deram tantos passos por vosso amor. Finalmente, neste adorável Sacramento está todo o Divino Verbo humanado, Que saiu do delicioso peito de Seu Eterno Pai para redimir e glorificar todos os mortais.
Antes quis mostrar-nos serem tão grandes Suas delícias em viver entre nós, que por uma só ausência que fez ao céu, fez-Se presente milhões de vezes aqui na terra. É verdade que uma nuvem O escondeu de nossos olhos no Monte Oliveiras, mas Seu amor designou que Se deixaria exposto nos Altares à nossa vista. Partiu-Se o Divino amante, sem Se ausentar, e, para assegurar-nos de Sua companhia, deu-nos o precioso dom de Si mesmo, deixando-nos empenhado Seu Corpo e Sangue.
Não obstante quisera eu me dissessem que coisa fez no mundo que assim enlaçou e uniu às criaturas o Coração de Jesus! Porque eu não sei mais que o que me diz o Evangelista: que o mundo não O conheceu, e que os Seus não O receberam. Não achou Ele na terra, da qual não soube ausentar-Se, mais que injúrias atrocíssimas e horríveis ingratidões, ferido com açoites, desprezado com opróbrios, um estábulo para nascer, e para morrer uma Cruz. Apenas encontrou um Pedro, que, tendo-O negado três vezes, só uma O confessou. Teve apenas uma Madalena, que, tendo-O ofendido muito, O soube amar.
Porém isso mesmo é o que rendeu o Coração de Jesus, para não poder apartar-Se do coração dos homens. Depois que Sansão deu a entender seu mais fino amor a Dalila, revelando-lhe o maior segredo em que constituía sua vida, diz o Sagrado Texto que ela logo fazia esforço para apartá-lo de si com aversão, porque era tanto o amor em que se abrasava Sansão para com Dalila, que nada o podia separar. Assim fez o mundo com Jesus. Ele o prende com fortes laços de amor, e o mundo o arroja de si com desumanos tratamentos. Mas então se abrasa mais estreitamente com ele o Divino Sansão, e, forjando daqueles acidentes uma cadeia, seu amor quedou-Se para sempre inseparável dos homens no Sacramento.
Aquele Anjo, que, só pelo espaço de uma noite, se estreitou em abraços com Jacó, procurava logo apartar-se dele. "Deixa-me ir-me embora, Jacó", lhe dizia, porque já nasce a aurora, e não convém a um Anjo deter-se mais de uma noite entre os braços de um homem. Mas, ó prodígio do amor divino! O que não é conveniente a um Anjo será conveniente a um Deus? Tanto há podido o amor de Jesus. Poucos instantes pareceram ao Rei dos Anjos os tantos anos que Ele vivera entre os braços e companhia dos homens; e se esses O arrojam de si e O despedem, se nem O conhecem nem O recebem, Ele, para não os deixar, sujeita-se a encerrar-se dentro de um Sacrário, em um rincão de uma Igreja. Mais ainda, como em prisão, sob uma chave.
Ah! Mortais! Se isso não vos faz abrasar em amor para com vosso Deus Sacramentado, asseguro-vos de que tendes entranhas de pederneira e corações de bronze. O Deus de Majestade é vosso prisioneiro, uma chave O guarda no Sacrário. Que maravilhas tão novas são estas que veem nossos olhos? No presépio o amor se faz homem, sendo Deus. No Altar O aprisiona, sendo Monarca. Ó, amor tirano, amor cruel! Exclama aqui Santo Agostinho, por que abates a Majestade? Por que condenas a Inocência?
Assim é, Almas Católicas, o amor condenou Jesus Sacramentado à prisão perpétua. Vede-O aí como preso debaixo dos acidentes de um pouco de pão, dentro de um pobre Sacrário, e entregue a uma vil criatura que, a seu arbítrio e vontade, já o abre, já o cerra. Aqui seguro O mantemos, e dentro daquela custódia nos está sempre dizendo aquelas doces palavras: Ecce vobiscum sum usque ad consummationem sæculi. “Aqui estou convosco até o fim do mundo”. É verdade que vivo e reino no céu, onde tenho Meu trono sobre as asas dos mais altos Serafins. Mas Eu sou realmente o mesmo Que aqui tendes na terra, porque embora deveras tenha-Me ausentado, nunca pude separar-Me de vós, e me entreguei em vossas mãos, oculto neste Sacramento. Já não ouvirão aqui as Almas que Me buscarem o que disseram os Anjos àquela amante, quando ansiosa me buscava no Sepulcro: Non est hic. Já Se foi teu Amado, porque os que guardavam Seu Corpo não souberam velar. Mas como nestes altares está sempre de sentinela Meu amor, não posso nem quero, não tenho coração para ausentar-Me.
Essa é, sem dúvida, a causa por que a Seráfica Virgem, Santa Teresa, se maravilhava quando ouvia dizer: Ó ditoso de mim se me achasse naqueles tempos em que Jesus conversava e vivia no mundo! Essa é uma necedade, dizia minha grande Madre, pois neste Sacramento, cifra do Divino amor, temos o mesmo Jesus, Que como Criança derramava tenras lágrimas num presépio; o mesmo Que quando homem suava, e pregava pelas praças, e caminhava a pé enxuto pelos mares; o mesmo Que, derramando sangue, pendia duma Cruz no Calvário; e, finalmente, o mesmo Que ressuscitou glorioso de um Sepulcro. Para que, pois, suspirar ou desejar outros tempos para ver e gozar da presença de Jesus?
Antes são agora mais felizes nossos tempos, porque então bem podíamos ver e ouvir em carne mortal o Redentor, mas não metê-l'O em nossos corações e em nossas entranhas. Então a uma só Madalena, que ardia em amor por Ele, consentiu que Lhe lavasse os pés com suas lágrimas, beijasse-os e enxugasse com seus cabelos, e dali a pouco tempo lhe ordenou não O tocasse. Então a um só Discípulo, e esse o mais valido, permitiu reclinar-se sobre Seu peito. Mas, neste amoroso Sacramento, não só consente que Lhe beijemos os pés, mas também a boca. Não só permite que folguemos sobre Seu peito, mas oferece a todos que descansemos dentro do mesmo peito, ou que Ele descanse dentro do peito de todos; porque como diz discretamente São Jerônimo, neste dulcíssimo Sacramento, nós comemos a Jesus, e Jesus nos come a nós: Jesus entra em nossos corações, e nós entramos no coração de Jesus.
Vede, pois, se tendes alguma razão de desejar aqueles tempos em que Este Verbo humanado vivia e conversava no mundo. Não me digais que sobre aqueles Altares não vedes outra coisa que uns poucos acidentes de pão, e que se esconde à vossa vista a formosura de Jesus. Porque eu vos peço e suplico que aviveis aquela Fé que recebestes nos peitos da Igreja Católica vossa Madre, que com o primeiro leite de seus infalíveis documentos vos instilou, que neste admirável Sacramento está o Corpo e Alma de Jesus com todas Suas perfeições e excelências.
Levantai, pois, com a consideração o sutilíssimo véu daqueles acidentes que cobrem o Corpo de Jesus, e vereis aquele mesmo rosto que na Glória desejam ver os Serafins. Vereis aqueles mesmos olhos, dos quais uma só vista bastava para serenar os mais afligidos corações. Vereis aquela mesma boca, que tem palavras de vida eterna e é a Fonte de todas as delícias do Paraíso. Ali estão aquelas mesmas mãos, artífices de tantas maravilhas, e aqueles mesmos pés, que na terra deram tantos passos por vosso amor. Finalmente, neste adorável Sacramento está todo o Divino Verbo humanado, Que saiu do delicioso peito de Seu Eterno Pai para redimir e glorificar todos os mortais.
Não julgueis que as partes do belíssimo Corpo de Jesus estão confusas e sem proporção no breve círculo d'Aquela Hóstia, porque, vos asseguro, acham-se ali todas com a mais admirável simetria que soube inventar Seu amor. Nem a cabeça está no lugar dos pés, nem esses no lugar das mãos, senão disposto tudo de tal maneira que estão submersos à sua vista os Serafins, num pélago de maravilhas. Ali pôs sua infinita sabedoria por um modo indivisível. Ali, retendo em ordem a Si mesmo toda a própria extensão, sem dependência de lugares, está todo em toda a Hóstia, e todo em qualquer parte d'Ela, e se acha Seu Sacratíssimo Corpo inteiro e admiravelmente quantitativo. Tanto pode com Ele Seu amor, que deste incompreensível e maravilhoso modo se deixou no Sacramento, antes que Se ausentasse para o Céu.
* Mais alto dos ceus, lugar da presença física de Deus, e onde residem os anjos e santos acolhidos no Paraíso. (N. do T.) .
* Mais alto dos ceus, lugar da presença física de Deus, e onde residem os anjos e santos acolhidos no Paraíso. (N. do T.) .
(Finezas de Jesus Sacramentado para con los hombres, e ingratitudes de los hombres para con Jesus Sacramentado. Escrito en Toscano, y Portugués por el P. F. Juan Joseph de S. Teresa Carmelita Descalzo. y traducido en castellano por D. Iñigo Rosende presbitero. Con licencia. Barcelona: En la Imprenta de los Herederos de Maria Angela Marti, Plaza de S. Jayme, año 1775.)
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